Ao dia de hoje (5/01/2025), a IVG (interrupção voluntária de gravidez) é enquadrada pela lei nº16/2007, de 17 de abril, que, essencialmente, nos diz que esta não é punível quando:
- For realizada, por opção da mulher, nas primeiras 10 semanas de gravidez;
- Houver seguros motivos para prever que o nascituro virá a sofrer, de forma incurável, de grave doença ou malformação congénita, e se for realizada nas primeiras 24 semanas.
Ou seja, em condições regulares, pode-se dizer que a IVG pode ser realizada até às10 semanas, mas, para além disto, é também obrigatório que a mulher grávida passe por um período de reflexão de, pelo menos, 3 dias (se a grávida solicitar, pode ter apoio psicológico ou social durante este período).
Ora, no passado dia 10 de janeiro, foi realizada uma sessão plenária na Assembleia da República onde foi discutida a alteração desta lei. Foram apresentadas propostas de todos os partidos, à exceção do PSD e IL. Entre as propostas, destacam-se as do PS, que defende o alargamento do prazo das 10 para as 12 semanas, e a abolição do período de reflexão; bem como a do BE, que defende a extensão do prazo das 10 para as 14 semanas, e, novamente, a abolição do período de reflexão.
A meu ver, esta é uma discussão de relevância extrema, que já vem tarde (e muito). Por mais que saiba que este é um tópico controverso, a minha opinião mantém-se a mesma desde que sei o que ‘aborto’ significa: “mas, se o bebé está na barriga dela, porque é que ela não pode escolher se o tem ou não?”. Claro que, à medida que cresci, acabei por compreender de certa forma o lado de quem discorda da legalização da IVG. No entanto, penso que esse seja um ponto de vista egoísta; afinal, qual é a razão para que por eu não imaginar que alguma vez recorreria à IVG, o que tem isso a ver com o direito de outras pessoas o fazerem, ou não? Ora, na mesma medida que eventualmente seria uma escolha minha não recorrer a essa intervenção, também seria uma escolha de outra mulher se esta o quisesse fazer.
Um dos principais motivos pelo qual, para mim, o alargamento do prazo onde é permitido o acesso à IVG é crucial, é o facto de que 85% dos países da EU têm um prazo de, pelo menos, 12 semanas onde a IVG pode decorrer. Portugal está entre os países mais restritivos da UE em relação ao aborto, o que de certa forma, seria previsível: enquanto os outros países têm feito melhorias nas leis encarregues de delimitar o processo do aborto, Portugal não lhe tocou desde que a mesma foi aprovada, em 2017.
Para além disto, houve também outro fator que me fez acreditar que a mudança era, de facto, necessária: segundo o semanário Expresso, em 2023, 530 portuguesas passaram a fronteira para abortar. Por mais que esta frase pareça radical, descreve perfeitamente o que aconteceu: como, para estas mulheres, o nosso prazo das 10 semanas foi insuficiente, deslocaram-se para Espanha, onde o prazo é de 14 semanas. Isto diz-nos que, efetivamente, ao dia de hoje este prazo torna-se insuficiente face às necessidades da população, portanto, devemos alterar o mesmo.
Além do prazo, creio que a mudança mais necessária é a abolição do dito “período de reflexão”. Qual é a justificação para que, depois de uma mulher tomar a decisão de marcar uma consulta com o fim de efetivamente processar a IVG, tem de obrigatoriamente refletir durante três dias sobre se é o que realmente quer? Para além de incómodo em relação aos prazos, ouso mesmo dizer que é um atentado à integridade da mulher, pois por que mais haveria de se questionar a sua decisão sobre o seu próprio corpo?
Em suma, por mais que esta sessão plenária tenha apenas levado a que ambas as propostas fossem reprovadas, acredito que o nosso país está finalmente no bom caminho em relação a esta lei. Novos tempos exigem novas circunstâncias, e acredito que, mais tarde ou mais cedo, propostas como estas vão ser aprovadas e Portugal vai, finalmente, deixar de ser um país tão atrasado no que toca a este tópico, dentro da EU.
Vitória Rocha, 10.ºF Clube de Jornalismo